Relator: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
Órgão julgador: Turma, DJe 3/9/2020).
Data do julgamento: 15 de janeiro de 2023
Ementa
RECURSO – Documento:6999384 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5003592-88.2023.8.24.0010/SC RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO RELATÓRIO No juízo da Vara Criminal da Comarca de Braço do Norte, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de M. A. N. F. , pelo cometimento, em tese, do delito previsto no art. 155, §§ 1º e 4º, II, do Código Penal, conforme narra a exordial acusatória (evento 1, DOC1): Na data de 15 de janeiro de 2023, por volta das 20h, portanto durante o repouso noturno, nas dependências da residência da vítima, localizada na rua Maria Kindermann Knabeen, s/n, bairro Bela Vista, neste Município e Comarca de Braço do Norte/SC, o denunciado M. A. N. F., ciente da ilicitude de sua conduta e com vontade orientada à prática criminosa, mediante abuso de confiança, consistente em ser irmão da vítima e nessa ...
(TJSC; Processo nº 5003592-88.2023.8.24.0010; Recurso: recurso; Relator: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO; Órgão julgador: Turma, DJe 3/9/2020).; Data do Julgamento: 15 de janeiro de 2023)
Texto completo da decisão
Documento:6999384 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Criminal Nº 5003592-88.2023.8.24.0010/SC
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
RELATÓRIO
No juízo da Vara Criminal da Comarca de Braço do Norte, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de M. A. N. F. , pelo cometimento, em tese, do delito previsto no art. 155, §§ 1º e 4º, II, do Código Penal, conforme narra a exordial acusatória (evento 1, DOC1):
Na data de 15 de janeiro de 2023, por volta das 20h, portanto durante o repouso noturno, nas dependências da residência da vítima, localizada na rua Maria Kindermann Knabeen, s/n, bairro Bela Vista, neste Município e Comarca de Braço do Norte/SC, o denunciado M. A. N. F., ciente da ilicitude de sua conduta e com vontade orientada à prática criminosa, mediante abuso de confiança, consistente em ser irmão da vítima e nessa condição ter amplo e irrestrito acesso à residência e suas adjacências, subtraiu, para proveito próprio, uma lata de tinta de 18 litros, na cor branco gelo, avaliada em R$ 200,00 (duzentos reais)1 , de propriedade de J. N. J..
Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio sentença de parcial procedência da pretensão acusatória, com o seguinte dispositivo (evento 51, DOC1):
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a denúncia para CONDENAR o acusado M. A. N. F., já qualificado, à pena de 02 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, substituída a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade, à razão de uma hora por dia de condenação e prestação pecuniária no valor de 1 salário mínimo vigente na data do pagamento, além do pagamento de 11 dias-multa, quantificada a unidade em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao disposto no 155, §4º, inciso II, do Código Penal.
Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade (art. 387, § 1º, do CPP), pois assim permaneceu no curso do feito, bem como pelo fato de não ter sido requerido pelo Ministério Público a decretação da prisão.
Isento o acusado de custas processuais, diante da gratuidade judiciária deferida no Ev. 20.1.
[...]
Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, em cujas razões clama pelo reconhecimento da escusa absolutória prevista no art. 181, II, do Código Penal. A título subsidiário, postula o afastamento da qualificadora do abuso de confiança, com a consequente desclassificação para a modalidade simples do delito de furto. Requer, ainda, o reconhecimento do princípio da insignificância, frente à inexpressividade do valor econômico da res furtiva. Pugna, ademais, pela fixação do regime aberto para o resgate inicial da reprimenda e pela substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Por fim, postula a fixação de honorários advocatícios à defensora nomeada, por sua atuação nesta instância recursal (evento 64, DOC1).
Contrarrazões pela manutenção incólume da sentença condenatória (evento 70, DOC1).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Senhor Dr. CID LUIZ RIBEIRO SCHMITZ, que se manifestou pelo "parcial conhecimento e, nessa extensão, pelo desprovimento do recurso interposto por M. A. N. F., para que sejam mantidos os termos da sentença condenatória" (evento 11, DOC1).
Este é o relatório.
assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6999384v2 e do código CRC fc7af220.
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Signatário (a): ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
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Documento:6999385 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Criminal Nº 5003592-88.2023.8.24.0010/SC
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
VOTO
Trata-se de recurso de apelação interposto por M. A. N. F. em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Braço do Norte que, julgando parcialmente procedente a pretensão acusatória, condenou-o às penas de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, mais pagamento de 11 (onze) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, por infração ao disposto no art. 155, §4º, II, do Código Penal. A pena privativa de liberdade restou substituída por duas penas restritivas de direitos.
1. Dos fatos
Segundo a exordial acusatória acostada ao evento 1, DOC1, "Na data de 15 de janeiro de 2023, por volta das 20h, portanto durante o repouso noturno, nas dependências da residência da vítima, localizada na rua Maria Kindermann Knabeen, s/n, bairro Bela Vista, neste Município e Comarca de Braço do Norte/SC, o denunciado M. A. N. F., ciente da ilicitude de sua conduta e com vontade orientada à prática criminosa, mediante abuso de confiança, consistente em ser irmão da vítima e nessa condição ter amplo e irrestrito acesso à residência e suas adjacências, subtraiu, para proveito próprio, uma lata de tinta de 18 litros, na cor branco gelo, avaliada em R$ 200,00 (duzentos reais), de propriedade de J. N. J.".
Acrescenta-se que a vítima registrou a ocorrência junto à Delegacia de Polícia de Braço do Norte, onde restou instaurado o inquérito policial de n. 43.23.00023 para elucidação dos fatos.
Após o indiciamento pela autoridade policial, Maiko foi denunciado, processado e condenado nos presentes autos, nos termos acima dispostos.
Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, em cujas razões clama pelo reconhecimento da escusa absolutória prevista no art. 181, II, do Código Penal. A título subsidiário, postula o afastamento da qualificadora do abuso de confiança, com a consequente desclassificação para a modalidade simples do delito de furto. Requer, ainda, o reconhecimento do princípio da insignificância, frente à inexpressividade do valor econômico da res furtiva. Pugna, ademais, pela fixação do regime aberto para o resgate inicial da reprimenda e pela substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Por fim, postula a fixação de honorários advocatícios à defensora nomeada, por sua atuação nesta instância recursal.
Passa-se à análise do reclamo.
2. Da admissibilidade
O recurso preenche parcialmente os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual não comporta integral conhecimento.
Afinal, a pretensa substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos já foi contemplada na origem, razão pela qual o apelante carece pontualmente de interesse recursal.
Neste norte, "por manifesta ausência de interesse recursal, não se pode conhecer de reclamo cujo alcance já restou deferido em decisão pretérita" (TJSC, Embargos de Declaração n. 0002815-14.2017.8.24.0039, rel. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. 30-07-2020).
Os demais pleitos preenchem os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual são conhecidos e serão abaixo analisados.
3. Do mérito: Do pretenso afastamento da qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do Código Penal e do reconhecimento do princípio bagatelar
A defesa clama pelo decote da qualificadora referente ao abuso de confiança, com a consequente desclassificação para a modalidade simples do delito de furto.
Alega, a tanto e em resumo, que "o mero vínculo familiar (ser irmão da vítima, conforme documentado) ou o simples acesso à residência, por si só, não configuram o abuso de confiança".
Com razão, adianta-se.
Importa destacar, de plano, que a materialidade e a autoria delitivas encontram-se incontroversas nos autos, restando plenamente comprovadas por meio do inquérito policial de n. 43.23.00023, em especial pelo boletim de ocorrência, pelo auto de avaliação indireta e pelo relatório de investigação (evento 1, DOC1 e evento 3, DOC1), além da prova oral colhida em ambas as etapas processuais.
Cumpre, então, verificar a necessidade de afastamento, ou não, da qualificadora referente ao abuso de confiança à hipótese sub judice, conforme requerido em apelo.
E, para melhor compreensão dos fatos, cumpre destacar a prova oral colhida em juízo, a qual restou devidamente apontada pelo Togado sentenciante e guarda fidedignidade às mídias produzidas, de modo que, a fim de conferir celeridade processual e evitar qualquer tipo de exercício de tautologia, aproveito os resumos das declarações, confira-se (evento 51, DOC1):
A vítima J. N. J., na fase preliminar, relatou que: “QUE Na noite de 15/01/2023, por volta de 20h, teve uma lata de tinta de 18 litros da cor branco gelo (não sabe a marca da tinta) subtraída pelo irmão, MAIKO NIEHUES PHILIPI; QUE haviam duas latas guardadas no paiol, escondida atrás de algumas madeiras, justamente para MAIKO não ver, pois ele é usuário de drogas e tudo quando tem oportunidade furta objetos de valor para conseguir dinheiro e trocar por drogas; QUE não houve arrombamento ou escalada; QUE MAIKO aproveitou quando ninguém estava olhando para praticar o furto, e utilizou um carrinho de mão para levar a lata de tinta do local e provavelmente esconder na vegetação; QUE confrontou MAIKO, sendo que ele negou a prática do furto; QUE a mãe do depoente, J. N., havia conferido na tarde do dia 15/01 que as duas latas de tinta ainda estavam no devido local; QUE depois de JANETE ter visto MAIKO ir ao paiol, uma das latas de tinta não foi mais encontrada, logo, não há outros suspeitos, senão MAIKO; QUE devido a dependência química, MAIKO tem "infernizado" a família e a vizinhança, praticando diversos furtos e vendendo tudo o que tem dentro de casa”.
Ouvida em juízo, sob o crivo do contraditório, o ofendido ratificou as declarações prestadas no âmbito policial, confirmando que o acusado estava mexendo no fundo da sua casa, onde se encontrava a lata de tinta. Foi sua mãe quem viu ele pegando o bem. A tinta custava R$ 200,00, sendo que o acusado já reparou o dano por meio de prestação de serviço.
[...]
A informante J. N., mãe da vítima e do acusado, ouvida na fase policial, disse que: “QUE é mãe de JULIAN e MAIKO; QUE haviam duas latas de tinta na parte de fora do paiol, escondidas de baixo de pedaços de madeira; QUE haviam sido escondidas pois já sabiam do histórico de MAIKO, visto que o mesmo é usuário de drogas, e atualmente se encontra em um centro de reabilitação em Lauro Muller/SC; QUE quando MAIKO encontrou as tintas, nem deu tempo de retira-las para esconder dele; QUE quando MAIKO encontrou-as, pegou apenas uma das latas de tinta e botou em um carrinho de mão, indo até a barranca e vendendo; QUE MAIKO não conseguiu levar a outra lata de tinta pois era muito pesada, e duas latas ele não aguentaria, visto ser de 18L cada; QUE não há câmeras no local; QUE não sabe quem possa ter comprado tal lata de tinta de MAIKO; QUE não possui maiores informações para a elucidação da autoria”.
Em juízo, afirmou que o acusado, à época dos fatos usuário de drogas, pegou a lata de tinta para comprar drogas. A lata de tinta pertencia ao seu filho Julian. Houve a reparação do dano.
Acrescenta-se que o acusado, na única oportunidade em que interrogado, reservou-se no direito de permanecer em silêncio (evento 56, VIDEO1).
Pois bem.
Sobre a qualificadora do abuso de confiança, cuja incidência foi reconhecida pelo Togado de origem, colhe-se da doutrina de Cezar Roberto Bitencourt:
10.2. Com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza (II)
Confiança é um sentimento interior de credibilidade, representando um vínculo subjetivo de respeito e consideração entre o agente e a vítima, pressupondo especial relação pessoal entre ambos. Abuso de confiança, por sua vez, consiste em uma espécie de traição à confiança, produto de relações de confiabilidade entre sujeitos ativo e passivo, exatamente a razão pela qual foi facilitado o acesso à coisa alheia. Exemplos típicos são os casos dos empregados domésticos, incluindo-se também quem se vale da relação de hospitalidade ou coabitação. Convém advertir, contudo, que não basta a simples relação empregatícia para caracterizar a qualificadora, sendo indispensável um vínculo subjetivo caracterizador da confiança e, por isso mesmo, passível de ser quebrado. Assim, simples furto de objetos no local de trabalho não qualifica o furto por abuso de confiança, que não é uma condição natural e obrigatória das relações trabalhistas ou domésticas; pode, no máximo, incidir, no furto simples, a agravante genérica das relações domésticas, de coabitação ou hospitalidade (art. 61, II, f).
É necessário que a confiança seja natural, conquistada normalmente, isto é, sem ardil, caso contrário a qualificadora que se apresenta não é o abuso de confiança, mas a fraude. Dois requisitos se fazem necessários: abuso da confiança depositada pelo ofendido e que a coisa se encontre, em razão dessa confiança, na esfera de disponibilidade do agente. É indispensável, ademais, que o agente tenha consciência de que pratica o crime abusando da relação de confiança que mantém com a vítima (Código penal comentado – 10. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019 , p. 687 - grifou-se)
Destaca-se, também, lição doutrinária de Cleber Masson:
Abuso de confiança é o sentimento de credibilidade ou de segurança que uma pessoa deposita em outra. [...] Esta qualificadora consiste na traição, pelo agente, da confiança que, oriunda de relações antecedentes entre ele e a vítima, faz com que o objeto material do furto tenha sido deixado ou ficasse exposto ao seu fácil alcance. (Código penal comentado - 6. ed. - São Paulo: Saraiva, 2018, p. 694, grifou-se).
Percebe-se, pelos ensinamentos acima, que para a configuração da qualificadora em apreço é necessária a existência de uma relação de confiança entre o autor do crime e o proprietário da res furtiva, a ponto deste vínculo facilitar a prática criminosa perpetrada pelo agente delitivo.
Ocorre que, no caso dos autos, em que pese o inequívoco laço familiar existente entre o acusado e a vítima (irmãos), não há comprovação sobre o vínculo de confiança existente entre ambos, tampouco que o hipotético vínculo tenha facilitado a prática criminosa ora escrutinada.
Cumpre mencionar, de antemão, que o acusado e o ofendido residiam no mesmo endereço ao tempo dos fatos (imóvel localizado na Rua Maria Kindermann Knabben, Bairro Bela Vista, Município de Braço do Norte/SC), ao passo em que a res furtiva (um galão de tinta) estava acondicionada aos fundos do terreno onde ambos conviviam, em uma espécie de paiol. Referida circunstância foi confirmada pela própria vítima em seu depoimento judicial, quando expressamente afirmou que "a nossa casa é junto, no mesmo lote, a tinta estava lá nos fundos" - evento 56, VIDEO1.
Referida constatação, com as devidas vênias, afasta a conclusão exposta pelo Magistrado sentenciante, no sentido de que "o réu entrou no paiol da casa da ofendida, sua irmã, sem nenhum impedimento ou obstáculo em razão do vínculo de parentesco e confiança, tornando mais reprovável sua conduta pela relação de confiança estabelecida com a vítima".
Na verdade, o acusado teve acesso ao paiol onde a res furtiva se encontrava devido à sua condição de morador do imóvel, d'onde conclui-se que o suposto e hipotético vínculo de confiança existente entre o apelante e a vítima em nada influenciou no ingresso de Maiko no local dos fatos.
E a atenta análise da prova oral coligida ao feito demonstra que, na verdade, não existia um mínimo vínculo de confiança entre o acusado e o ofendido - pelo contrário, havia uma relação de desconfiança estabelecida entre ambos à época dos fatos.
Aliás, Julian, em ambos os seus depoimentos, foi categórico ao relatar os sentimentos de desconfiança e de suspeição que nutria pelo irmão, destacando-se os seguintes excertos do seu depoimento prestado em delegacia, poucos dias após o ocorrido (evento 1, DOC1):
QUE havia duas latas guardadas no paiol, escondida atrás de algumas madeiras, justamente para MAIKO não ver, pois ele é usuário de drogas e tudo quando tem oportunidade furta objetos de valor para conseguir dinheiro e trocar por drogas; [...] QUE devido a dependência química, MAIKO tem "infernizado" a família e a vizinhança, praticando diversos furtos e vendendo tudo o que tem dentro de casa”.
E não foram outros os relatos prestados por Janete, mãe de Julian e de Maikon, cabendo destacar os seguintes dizeres exteriorizados pela testiga à autoridade policial (evento 1, DOC1):
QUE é mãe de JULIAN e MAIKO; QUE havia duas latas de tinta na parte de fora do paiol, escondidas de baixo de pedaços de madeira; QUE haviam sido escondidas pois já sabiam do histórico de MAIKO, visto que o mesmo é usuário de drogas.
Fácil perceber, nestes termos, que não havia qualquer vínculo de confiança existente entre a vítima e o acusado, tanto que a res furtiva, na verdade, havia sido escondida pelo ofendido, a fim de que seu irmão, que convivia no mesmo imóvel, não a encontrasse. E tampouco há, neste trilhar, como considerar que o galão de tinta subtraído estava exposto ao fácil alcance do réu, justamente em razão do hipotético (e inexistente) vínculo de confiança presente entre ambos.
Neste norte, mesmo que existente a suposta relação de confiabilidade entre a vítima e o réu - o que se pontua apenas a título de argumentação, eis que o vínculo é inexistente -, referido laço não influenciou, minimamente, no ingresso de Maiko no local dos fatos e na posterior subtração do galão de tinta pertencente ao seu irmão.
E, pelas circunstâncias expostas nos autos, não há outro caminho a este Colegiado, senão o de dar pontual provimento ao recurso, desclassificando-se a conduta delitiva para aquela prevista no caput do art. 155 do Código Penal.
Esta Corte de Justiça, em situação fática distinta, mas cuja ratio decidendi é semelhante, assim já decidiu:
APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA (CP, ART. 155, § 4º, II). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO.
1. ABUSO DE CONFIANÇA. RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. AUSÊNCIA DE ESPECIAL CREDIBILIDADE. 2. TENTATIVA (CP, ART. 14, II). ITER CRIMINIS. FRAÇÃO. 3. MULTA. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. SALÁRIO MÍNIMO. ÉPOCA DOS FATOS. ÉPOCA DO PAGAMENTO.
1. Tão somente a relação empregatícia não é suficiente para configurar a circunstância qualificadora do abuso de confiança do crime de furto, de modo que não é toda subtração praticada contra o empregador que resultará no tipo penal mais grave e, no caso de um funcionário que não detém qualquer relação subjetiva de confiança e não existindo prova de que a ele é imputada superior credibilidade ou de que tenha se valido de sua condição para a execução do delito ao afanar camisetas em depósito de uma malharia, não se está diante de um furto qualificado.
[...]
(TJSC, Apelação Criminal n. 0008295-95.2019.8.24.0008, do , rel. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 28-02-2023).
Deste Colegiado, colhe-se:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO E CONTRA A SEGURANÇA VIÁRIA. FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA (ARTIGO 155, §4º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL) E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ARTIGO 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. (I) PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO PATRIMONIAL. DESCABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS. DECLARAÇÕES FIRMES DA VÍTIMA, DE TESTEMUNHA PRESENCIAL E DOS AGENTES PÚBLICOS. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS E PROVA ORAL QUE TRAZEM CERTEZA QUANTO AO DOLO DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO DA TESE DE FURTO DE USO. TODAVIA, AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO ABUSO DE CONFIANÇA QUE SE IMPÕE. RELAÇÃO ESPECIAL DE CONFIANÇA ENTRE AUTOR E VÍTIMA QUE NÃO FICOU SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADO.[...] - Para que seja configurada a qualificadora do inciso II do § 4º do artigo 155 do Código Penal, é necessária a demonstração da relação especial de confiança entre autor e vítima. [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0001288-72.2015.8.24.0079, de Videira, rel. Carlos Alberto Civinski, Primeira Câmara Criminal, j. 19-04-2018 - grifou-se).
O pontual provimento do reclamo, neste norte, é medida de rigor, com a desclassificação para a modalidade simples do delito.
E, com o afastamento da qualificadora, imperioso o reconhecimento, na presente hipótese, do princípio da insignificância.
Sobre o conceito do princípio bagatelar, a doutrina explica:
Esse princípio deita suas raízes no Direito Romano, onde se aplicava a máxima civilista de minimis non curat praetor, sustentando a desnecessidade de se tutelar lesões insignificantes aos bens jurídicos (integridade corporal, patrimônio, honra, administração pública, meio ambiente, etc.). Assim, restaria ao Direito Penal a tutela de lesões de maior monta aos bens jurídicos, deixando ao desabrigo os titulares de bens jurídicos alvo de lesões consideradas insignificantes" (ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Manual de Direito Penal - 8. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2012, p. 45).
A propósito, conforme entendimento sedimentado na jurisprudência dos Tribunais Superiores, a aplicação do princípio da insignificância contempla: a) a mínima ofensividade da conduta; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC n. 92.463 e HC n. 92.961 do STF e Resp n. 1084540 do STJ). grifo nosso
Nestes termos, observa-se que, na hipótese, o valor do galão de tinta subtraído pelo réu corresponde ao montante de R$ 200,00 (duzentos reais), conforme auto de avaliação indireta acostado ao evento 1, DOC1, o que representa pouco mais de 15% (quinze por cento) do salário mínimo vigente à época dos fatos (R$ 1.302,00).
Não se desconhece, importante salientar, que os tribunais superiores firmaram o entendimento de que se considera valor irrisório aquele que não supera 10% (dez por cento) do valor do salário mínimo à época do crime.
No entanto, o patamar destacado é uma construção meramente jurisprudencial e não se reveste de caráter absoluto, de modo que é possível reconhecer a bagatela quando o valor da res furtiva seja superior a esta porcentagem, sendo indispensável, entretanto, a análise criteriosa de todas as circunstâncias da ação delitiva. Do mesmo modo, é possível a não aplicação do princípio em comento mesmo que o bem seja inferior ao referido patamar, considerando os demais fatores do caso concreto.
A propósito, o STJ assim se posicionou:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. FURTO QUALIFICADO. VIOLAÇÃO DO ART. 155, § 4º, IV, DO CP. PLEITO DE AFASTAMENTO DO RECONHECIMENTO DA BAGATELA. CONCURSO DE AGENTES. PRIMARIEDADE TÉCNICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. RES FURTIVAE AVALIADA EM R$ 195, 00. INTEGRAL RESTITUIÇÃO DOS BENS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUE REJEITOU A DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.
1. O Tribunal catarinense considerou que, na hipótese, trata-se de um furto de uma carteira que possuía R$ 195,00 (cento e noventa e cinco reais) em notas e moedas, subtraída da cesta da bicicleta da vítima, a qual estava estacionada em frente ao estabelecimento comercial farmácia Sul Catarinense. [...] Embora o valor da res furtiva seja superior a 10% do salário mínimo vigente ao tempo da suposta infração penal, tal requisito não pode ser o único parâmetro a ser avaliado, devendo-se levar em consideração que a carteira e o montante foram totalmente recuperados, conforme termo de reconhecimento e entrega de fl. 23, não se mostrando recomendável o processamento da ação penal, eis que evidente a inexpressividade da lesão jurídica provocada. [...] Outrossim, consoante se extrai das certidões de antecedentes, não existe sentença condenatória alcançada pelo manto da coisa julgada, de modo que não pode ser utilizada como fator conducente ao afastamento da suscitada aplicação do princípio da insignificância, haja vista que os recorridos devem ser considerados tecnicamente primários.
2. Não se desconhece a posição majoritária desta Corte Superior acerca da não aplicação do princípio da insignificância nas hipóteses em que a res furtiva seja avaliada em patamar superior a 10% do salário mínimo vigente à época do delito. Contudo, no caso concreto, devem ser sopesadas as demais circunstâncias fáticas, admitindo-se a incidência do aludido princípio, conforme reconhecido pelo Tribunal de origem.
3. Em face da constatada primariedade, ainda que técnica, dos agentes, bem como do montante, em sua integralidade, ter sido restituído à vítima, mostra-se presente a excepcionalidade que autoriza a incidência do princípio da insignificância.
4. Na hipótese, apesar de os bens subtraídos somarem cerca de 23% do salário mínimo vigente em 2016, considerando tratar-se de paciente primário, o qual possui, em sua folha de antecedentes criminais, somente a anotação referente ao presente processo, bem como que tentou subtrair 3 peças de carne, as quais foram restituídas à vítima, não se mostra recomendável sua condenação, eis que evidente a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC n. 600.107/SP, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 3/9/2020).
5. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1872218/SC, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 03/02/2021
In casu, verifica-se que as demais circunstâncias são favoráveis ao acusado. Não houve a utilização de qualquer tipo de violência contra a pessoa ou contra a coisa, ou o emprego de subterfúgios que qualificam o delito, conforme acima exposto.
Ademais, o próprio ofendido, quando ouvido sob o crivo do contraditório, foi categórico ao relatar que o acusado, seu próprio irmão, procurou-o de forma espontânea para reparar os danos causados pela infração, tendo prestado serviços diversos a fim de ressarcir os prejuízos ocasionados. Não foi outro o relato prestado pela testemunha Janete, mãe de ambos (acusado e vítima), quando expressamente consignou que Maiko já reparou os danos ocasionados ao irmão, oportunidade em que acrescentou que a família já se acertou e superou o ocorrido - restando, portanto, evidente a mínima ofensividade da conduta, a ausência de periculosidade social da ação e a inexpressividade da lesão jurídica.
A propósito, o princípio da insignificância constitui relevante instrumento de contenção do Direito Penal, ao afastar a tipicidade material de condutas que, embora formalmente típicas, não representam lesão significativa ao bem jurídico tutelado. Tal diretriz visa preservar a intervenção mínima do Estado, evitando a movimentação desnecessária do aparato repressivo em situações de escassa relevância penal, como a presente.
A aplicação do princípio bagatelar, nesse sentido, revela-se especialmente pertinente em contextos corriqueiros e familiares, nos quais o conflito pode ser resolvido por meios menos gravosos e mais adequados à realidade social envolvida - cabendo destacar que, ao que tudo indica, a família permanece residindo no mesmo endereço, convivendo de forma harmoniosa após o ocorrido. A persecução penal, em tais hipóteses, além de sobrecarregar o sistema judiciário, compromete sua efetividade ao desviar recursos e atenção de casos que demandam maior rigor punitivo.
De mais a mais, não há como fechar os olhos à informação prestada pela vítima e pela testemunha Janete, dando conta do estado de dependência química do acusado ao tempo do ocorrido, fator que inevitavelmente contribuiu para a prática delitiva e que, à luz da compreensão desta relatora, reduz o grau de reprovabilidade do comportamento por si adotado.
Por fim, destaca-se que a existência de condenação por fato anterior ao presente (pela prática do crime previsto no art. 129 § 13º, do Código Penal), ou a existência de processos em andamento em desfavor do acusado, à luz das particularidades acima delineadas, não são fatores determinantes e suficientes ao afastamento do princípio bagatelar na presente hipótese.
Cita-se, no ponto, julgado desta Corte de Justiça, mutatis mutandis:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO SIMPLES (ART. 155, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO MINISTERIAL.
PLEITO CONDENATÓRIO ANTE O AFASTAMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO CABIMENTO. ATIPICIDADE DA CONDUTA VERIFICADA. VALOR DA RES FURTIVA CONSIDERADO IRRISÓRIO E INTEGRALMENTE RESTITUÍDO À VÍTIMA. RÉU TECNICAMENTE PRIMÁRIO. REGISTRO DE OUTRAS AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO INSUFICIENTE PARA REVOGAR O BENEFÍCIO. EXCEPCIONALIDADE EVIDENTE. REDUZIDO GRAU DE OFENSIVIDADE DA CONDUTA E INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO JURÍDICA VERIFICADOS. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO QUE AUTORIZAM O RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA BAGATELA. PRECEDENTES. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBA DEVIDA ANTE O TRABALHO REALIZADO PELA DEFENSORA NOMEADA (CONTRARRAZÕES). VALOR ESTIPULADO DE ACORDO COM O ART. 85, § 2º, E § 8º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E RESOLUÇÕES N. 5/2019 E N. 16/2021 DO CONSELHO DA MAGISTRATURA DESTA CORTE.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
- "In casu, em que pese tratar-se de furto qualificado de bens de valor superior a 10% do salário mínimo vigente na data dos fatos, o acusado é tecnicamente primário e, diante da natureza dos bens furtados, alguns de natureza alimentícia, não há como afastar, nesta esfera, a conclusão do acórdão recorrido acerca da excepcionalidade da hipótese dos autos e da mínima ofensividade da conduta imputada." (AgRg no REsp n. 2.013.352/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/5/2023, DJe de 10/5/2023.)
- "Considerando-se o valor presumidamente ínfimo da res furtiva, pertencentes à pessoa jurídica e o fato de se tratar de réu que ostenta apenas uma condenação definitiva, além de processos em andamento, não se justifica a não aplicação do princípio da insignificância. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, "a existência de anotações criminais anteriores, por si só, não exclui a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, mas deve ser sopesada junto com as demais circunstâncias fáticas, admitindo-se a incidência do aludido princípio ao reincidente em situações excepcionais" (AgRg no REsp n. 1.988.544/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 13/9/2022, DJe de 16/9/2022).
(TJSC, Apelação Criminal n. 5004730-44.2022.8.24.0069, do , rel. Luiz Neri Oliveira de Souza, Quinta Câmara Criminal, j. 20-06-2024).
Portanto, à luz das particularidades da presente hipótese, da mínima ofensividade da conduta, da ausência de periculosidade social da ação e da inexpressividade da lesão jurídica ocasionada pelo réu - situação, portanto, excepcionalíssima -, a reforma da sentença é medida imperiosa, a fim de afastar a qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do Código Penal e de absolver M. A. N. F. quanto à prática do crime de furto simples, pelo reconhecimento da atipicidade da conduta em razão do princípio da insignificância.
O provimento do recurso, nestes termos, é medida de rigor.
4. Dos honorários advocatícios
Por derradeiro, a defesa postula a fixação de honorários advocatícios à defensora nomeada, por sua atuação nesta instância recursal.
No ponto, a despeito do entendimento anteriormente firmado, esta Câmara Criminal, com o objetivo de uniformizar a jurisprudência no âmbito deste Tribunal, passa a reconhecer o direito à fixação de honorários advocatícios aos defensores dativos pela atuação em sede recursal, independentemente de eventual arbitramento realizado na instância de origem.
Sobre a quantificação dos honorários advocatícios aos defensores dativos, a Seção Criminal deste Tribunal, em julgamento da sessão administrativa realizada em 12.6.2019, decidiu que a fixação da quantificação deve respeitar os valores mínimo e máximo previstos no Anexo Único da Resolução n. 5 de 8 de abril de 2019, editada pelo Conselho da Magistratura deste Sodalício.
A Resolução prevê, ainda, a possibilidade de modular quantitativa e qualitativamente os valores fixados, conforme as orientações contidas no art. 8º, in verbis:
Art. 8º A fixação de honorários advocatícios, periciais e assistenciais a serem pagos aos profissionais de que trata esta resolução respeitará os limites mínimos e máximos previstos no Anexo Único desta resolução, bem como observará, no que couber:
I – o nível de especialização e a complexidade do trabalho;
II – a natureza e a importância da causa;
III – o grau de zelo do profissional;
IV – o trabalho realizado pelo profissional;
V – o lugar da prestação do serviço; e
VI – o tempo de tramitação do processo.
§ 1º Ainda que haja processos incidentes, a remuneração será única e determinada levando-se em conta a ação principal.
§ 2º Se apenas um advogado dativo atuar na defesa de mais de um assistido em um mesmo processo, o arbitramento dos honorários considerará o limite máximo acrescido de até 50% (cinquenta por cento).
§ 3º Os honorários advocatícios devidos em razão da prática de atos isolados serão arbitrados entre 1/3 (um terço) e 1/2 (metade) do valor mínimo previsto nesta resolução.
§ 4º Em situações excepcionais e considerando as especificidades do caso concreto, a autoridade judiciária poderá, em decisão fundamentada, arbitrar honorários até o limite de 3 (três) vezes o valor máximo previsto na tabela constante no Anexo Único desta resolução.
Após uma série de atualizações pela edição de novas Resoluções, convém transcrever o parâmetro de remuneração para os advogados dativos atuantes na área criminal, estabelecido pela Resolução CM n. 5/2023, vigente a partir de 19-04-2023, veja-se:
10. CAUSAS CRIMINAIS
VALOR MÍNIMO
VALOR MÁXIMO
MAJORAÇÃO PREVISTA NO § 4º DO ART. 8º
10.1 Ações criminais de procedimento ordinário ou sumário
R$ 530,01
R$ 1.072,03
R$ 3.216,09
10.2 Ações do Tribunal do Júri - fase do sumário de culpa
R$ 530,01
R$ 1.072,03
R$ 3.216,09
10.3 Ações do Tribunal do Júri - fase do plenário do júri
R$ 1.022,75
R$ 2.363,70
R$ 7.091,10
10.4 Interposição de recurso ou apresentação de contrarrazões recursais
R$ 409,11
R$ 490,93
R$ 1.472,79
No tocante ao caso vertente, infere-se que a causídica dativa, Dra. Larissa Marcelino (OAB/SC 68.857), foi nomeada pelo Juízo a quo no início da instrução (evento 11, DOC1), sendo-lhe fixada a remuneração de R$ 1.072,03 (um mil setenta e dois reais e três centavos) em sentença (evento 51, DOC1).
Como visto, para a interposição de recursos em processos criminais, a tabela define um valor mínimo de R$ 409,11 (quatrocentos e nove reais e onze centavos) e um máximo de R$ 490,93 (quatrocentos e noventa reais e noventa e três centavos). Em casos excepcionais, é possível fixar um valor acima desse teto, conforme o artigo 8º, §4º, da referida Resolução.
No presente caso, considerando a complexidade da causa e o exímio trabalho realizado pela nobre defensora - o qual culminou, inclusive, na absolvição do seu defendido -, fixa-se a verba honorária em R$ 490,93 (quatrocentos e noventa reais e noventa e três centavos), pela atuação em sede recursal.
5. Do dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer e de dar provimento ao recurso, a fim de afastar a qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do Código Penal e de absolver M. A. N. F. quanto à prática do crime de furto simples, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal. Fixa-se verba honorária à defensora nomeada, por sua atuação nesta instância recursal.
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Documento:6999386 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Criminal Nº 5003592-88.2023.8.24.0010/SC
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
EMENTA
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação criminal interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida na denúncia, para condenar o acusado/apelante às penas de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, mais pagamento de 11 (onze) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, por infração ao disposto no art. 155, §4º, II, do Código Penal. A pena privativa de liberdade restou substituída por duas penas restritivas de direitos.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em saber se: (I) há de ser afastada a qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do CP, mais especificamente a do abuso de confiança, com a consequente desclassificação para a modalidade simples do delito; (II) o apelante deve ser absolvido por atipicidade material da conduta, à luz do princípio da insignificância; (III) deve ser operada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos; (IV) a defensora nomeada para a defesa do acusado faz jus à majoração da verba honorária arbitrada na origem pela atuação nesta instância recursal.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A pretensa substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos já foi contemplada na origem, razão pela qual o apelante carece pontualmente de interesse recursal. Pleito não conhecido.
4. Para a configuração da qualificadora em apreço, conforme doutrina, é necessária a existência de uma relação de confiança entre o autor do crime e o proprietário da res furtiva, a ponto deste vínculo facilitar a prática criminosa perpetrada pelo agente delitivo.
4. Não há provas, nos autos, sobre a suposta relação de confiança existente entre a vítima e o apelante, tampouco que o hipotético vínculo tenha facilitado o furto praticado pelo acusado, de modo que não há outro caminho a este Colegiado, senão o de dar pontual provimento ao recurso, desclassificando-se a conduta delitiva para aquela prevista no caput do art. 155 do Código Penal.
5. Conforme entendimento sedimentado na jurisprudência dos Tribunais Superiores, a aplicação do princípio da insignificância contempla: a) a mínima ofensividade da conduta; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC n. 92.463 e HC n. 92.961 do STF e Resp n. 1084540 do STJ).
6. Circunstâncias do caso concreto, excepcionalíssimas, que permitem o reconhecimento do princípio bagatelar. Res furtiva com valor pouco superior a 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente à época dos fatos; ausência de violência contra a pessoa ou contra a coisa; inexistência de subterfúgios que qualificam o delito; acusado que ressarciu a vítima, seu próprio irmão, de maneira espontânea; família que, ao que tudo indica, permanece residindo no mesmo endereço, convivendo de forma harmoniosa após o ocorrido. Absolvição devida.
7. A despeito do entendimento anteriormente firmado, esta Câmara Criminal, com o objetivo de uniformizar a jurisprudência no âmbito deste Tribunal, passa a reconhecer o direito à fixação de honorários advocatícios aos defensores dativos pela atuação em sede recursal, independentemente de eventual arbitramento realizado na instância de origem. Honorários majorados.
IV. DISPOSITIVO
8. Recurso parcialmente conhecido e, na extensão, provido, a fim de afastar a qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do Código Penal e de absolver M. A. N. F. quanto à prática do crime de furto simples, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal. Verba honorária majorada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara Criminal do decidiu, por unanimidade, conhecer e de dar provimento ao recurso, a fim de afastar a qualificadora prevista no art. 155, §4º, II, do Código Penal e de absolver M. A. N. F. quanto à prática do crime de furto simples, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal. Fixa-se verba honorária à defensora nomeada, por sua atuação nesta instância recursal, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6999386v4 e do código CRC 839eb1a8.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 06/11/2025 A 12/11/2025
Apelação Criminal Nº 5003592-88.2023.8.24.0010/SC
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
PRESIDENTE: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA
PROCURADOR(A): PEDRO SERGIO STEIL
Certifico que este processo foi incluído como item 229 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 21/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 06/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 19:00.
Certifico que a 1ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E DE DAR PROVIMENTO AO RECURSO, A FIM DE AFASTAR A QUALIFICADORA PREVISTA NO ART. 155, §4º, II, DO CÓDIGO PENAL E DE ABSOLVER M. A. N. F. QUANTO À PRÁTICA DO CRIME DE FURTO SIMPLES, COM FULCRO NO ART. 386, III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. FIXA-SE VERBA HONORÁRIA À DEFENSORA NOMEADA, POR SUA ATUAÇÃO NESTA INSTÂNCIA RECURSAL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
Votante: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
Votante: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO
Votante: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI
ALEXANDRE AUGUSTO DE OLIVEIRA HANSEL
Secretário
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